Era para ser apenas mais um capítulo do script corporativista do Supremo Tribunal Federal. Um ato de abuso institucional coberto por discursos técnicos, legitimado pelos próprios ministros, e varrido para debaixo do tapete com a ajuda da grande imprensa.
Mas desta vez, algo saiu errado.
Muito errado.
No centro da polêmica, o ministro Alexandre de Moraes — aquele que se tornou sinônimo de truculência e perseguição política — decidiu intimar o ex-presidente Jair Bolsonaro... em uma cama de UTI.
Sim, você ouviu certo: enquanto Bolsonaro ainda se recuperava de uma cirurgia longa e complexa, com aparelhos ligados ao seu corpo, Moraes achou conveniente avançar com a intimação judicial. E foi aí que a máscara começou a cair — e não apenas para o público brasileiro, mas para o mundo inteiro.
A truculência foi tão gritante que nem mesmo os porta-vozes tradicionais da esquerda, historicamente tolerantes com os excessos do ministro, conseguiram ficar do lado dele. Surgiram colunas, reportagens, críticas. Vozes que antes silenciavam em nome do projeto político agora se levantaram, denunciando o que classificaram como "um dos atos mais abjetos da história recente do STF".
Mas antes de irmos mais fundo, pare e pense: o que leva uma instituição como o Supremo Tribunal Federal, guardiã da Constituição, a permitir — e a apoiar — um ato tão cruel? Será apenas lealdade cega? Ou seria medo?
A Tentativa de Blindagem
Assim que o escândalo explodiu nas redes sociais e nos jornais internacionais, os ministros do STF entraram em modo de contenção.
Era preciso proteger Moraes.
Era preciso manter a muralha intacta.
Na coluna de Bela Megale, no jornal O Globo, um esforço quase desesperado ficou evidente: "Ministros do STF apoiam a decisão de Alexandre de Moraes sobre intimar Bolsonaro na UTI".
Mas a defesa vinha acompanhada de um constrangido puxão de orelha. Nas entrelinhas, admitiam: não foi o cenário ideal.
Tentavam suavizar o impacto, jogando a culpa na vítima. A narrativa construída era que Bolsonaro, ao fazer uma live da UTI, teria "se colocado" naquela situação.
Agora, respire fundo e reflita: desde quando uma pessoa perde seus direitos constitucionais porque decidiu fazer uma transmissão ao vivo? Desde quando o direito à saúde, à dignidade e à proteção contra abusos depende do comportamento da vítima?
O que se viu foi a repetição de uma lógica perversa: a de culpar quem sofreu o abuso para justificar o abuso cometido.
A Lei Não Muda Para Servir Interesses
A tentativa de dar respaldo jurídico ao ato de Moraes se mostrou ainda mais frágil sob análise técnica.
Os ministros alegaram que a intimação se justificava porque Bolsonaro "mostrou estar consciente" na live.
Mas aqui entra um ponto crucial, que desmonta essa argumentação: a lei é clara em proibir intimações a enfermos em estado grave — e essa proteção está prevista no Código de Processo Civil, que se aplica subsidiariamente aos processos penais quando há lacunas na lei penal.
Ou seja: Bolsonaro tinha o direito de se comunicar como quisesse.
Quem estava proibido era o STF — proibido de fazer o que fez.
A pergunta que fica é: se nem a lei, nem a moral, nem o bom senso permitiam essa intimação, o que justificou o ato?
Seria apenas a arrogância de quem se sente intocável?
A Reação que Veio de Onde Menos se Esperava
E foi então que algo surpreendente aconteceu.
Algo que nem o mais pessimista ministro do STF esperava.
A crítica veio de onde deveria vir o silêncio.
Matheus Leitão, jornalista da revista Veja e conhecido apoiador das pautas progressistas, publicou uma coluna devastadora: "O erro de Alexandre de Moraes que vai custar muito caro ao STF".
Em suas palavras, a intimação de Bolsonaro foi "um dos atos mais abjetos" do Supremo nos últimos anos.
"Abjeto."
Não é um adjetivo usado de forma leviana.
Não é uma crítica comum em Brasília.
Quando até a imprensa militante reconhece a abjeção de um ato, é porque os limites foram ultrapassados de forma grotesca.
O próprio Leitão foi além: destacou que, diante da repercussão negativa, o STF precisou divulgar uma nota explicativa para justificar o injustificável — e lembrou de uma máxima infalível em Brasília: quando um poder precisa explicar um ato, é porque ele deu muito errado.
Um Abuso Que Rompeu Barreiras Internacionais
A indignação não ficou restrita ao Brasil.
Deputados europeus, conselheiros ligados ao ex-presidente Donald Trump e líderes conservadores ao redor do mundo começaram a se pronunciar, exigindo sanções e punições contra Moraes.
O vídeo de Bolsonaro, ainda acamado, ganhou o mundo.
E assim, aquilo que parecia ser apenas mais uma violência institucional doméstica virou um escândalo internacional.
E aqui cabe outra reflexão profunda:
Quando um país chega ao ponto de ver seus juízes mais poderosos sendo denunciados globalmente por abusos de autoridade, qual é o impacto sobre sua democracia?
A Perseguição Que Não Dá Mais Para Negar
Até mesmo Leitão, que já relativizou outros abusos de Moraes, reconheceu: a imagem transmitida para o mundo é a de perseguição política contra Bolsonaro.
Não se trata mais de interpretações.
Não se trata de narrativas.
Quando o STF intima um paciente em UTI, com inúmeros aparelhos ligados ao corpo, dias após uma cirurgia de emergência, a mensagem é inequívoca: não existem limites.
Mas será que eles realmente acreditam que poderão seguir assim, sem consequências?
A Muralha Corporativista Começa a Rachar
Hoje, vemos ministros como Luiz Fux e André Mendonça manifestarem, ainda que timidamente, desconfortos e desacordos.
Rachaduras discretas, mas significativas.
E a pergunta que fica no ar é: será que essas rachaduras irão crescer?
Será que finalmente veremos a implosão do corporativismo que protege Moraes a qualquer custo?
Ou será que, como tantas vezes na história, a indignação irá se dissipar, e tudo voltará ao seu estado normal de abuso e silêncio?
Um Momento Decisivo
Seja qual for a resposta, uma coisa é certa:
Este episódio marca um ponto de inflexão.
A blindagem que parecia impenetrável agora mostra sinais de desgaste.
A sociedade viu.
O mundo viu.
E uma vez que a verdade é vista, ela não pode mais ser invisibilizada.
Até onde o STF está disposto a ir para proteger um de seus membros?
E até onde o povo brasileiro está disposto a tolerar?
Essas são perguntas que ficarão ecoando — nas redes sociais, nas ruas, nas eleições futuras.
Porque a democracia verdadeira só sobrevive onde há limites para o poder.
E hoje, mais do que nunca, cabe a nós exigir esses limites.
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